domingo, 10 de junho de 2007

O engenheiro da prefeitura

Nas pequenas cidades dentre as figuras mais conhecidas encontram-se o padre, o médico, o juiz, o prefeito e o engenheiro da prefeitura. Este último vem a ser o responsável pela maior parte das construções no município e, simultaneamente, é quem aprova projetos, licencia obras e concede o habite-se.

Esta situação ambígua na qual um profissional projeta e aprova os próprios trabalhos é considerada normal pelos habitantes das pequenas cidades que não percebem qualquer conflito moral neste assunto.

Devido ao reduzido número de profissionais dispostos a trabalhar no interior é comum a mesma pessoa exercer dois ou mais papéis por falta de outros interessados em assumi-los.

A atração exercida pelas grandes e médias cidades contribuiu para consolidar esta estranha realidade na qual o mesmo profissional exerce o papel de juiz e réu.

Em contrapartida, nos centros maiores sobram profissionais, faltam postos de trabalho e a remuneração no serviço público está abaixo da expectativa. As greves freqüentes confirmam esta situação.

A segmentação é uma das características destes centros, neles os profissionais pertencem à iniciativa privada ou ao serviço público e o papel de cada um é nitidamente percebido pela sociedade.

A criação da SUSP e do IPUF na segunda metade da década de 70 veio disciplinar as atividades da construção civil que naquele período registrou o aumento do volume de obras e a criação de diversas construtoras.

A lisura do trabalho dos técnicos da SUSP na aplicação dos dispositivos definidos no Plano Diretor e no Código de Obras não sofreu qualquer questionamento até o início da década de 80 quando as contravenções na praia da Joaquina vieram a público através da imprensa.

Após este episódio isolado passou uma década sem qualquer registro de irregularidades divulgadas pelos meios de comunicação.

Ocasionalmente eram citadas as ocupações ilegais de áreas públicas cuja responsabilidade era atribuída à interferência de vereadores e religiosos.

A construção civil em Florianópolis é um universo de dimensões reduzidas. Ocasionalmente a mídia sussurada informava que algumas construtoras haviam desenvolvido o hábito de presentear membros da SUSP com eletro-eletrônicos mas, parafraseando o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, este gesto era considerado irrelevante, “uma corrupçãozinha à toa”.

O primeiro sinal de que algo estava por mudar em relação à aplicação dos dispositivos legais ocorreu em 89 quando o então prefeito, valendo-se de um simulacro de legalidade, promoveu a liberação de uma série de obras que não atendiam a legislação em vigor. (ver www.corrupcionario.blogspot.com).

Devido às ironias da política a lisura dos procedimentos da SUSP foi definitivamente comprometida na administração 1993-1996 quando por opção dos eleitores a administração municipal foi entregue à extrema esquerda.

Neste período ocorreu uma seqüência de greves dos funcionários da SUSP e do IPUF reivindicando melhorias nos salários e nas condições de trabalho.

O prefeito, por não dispor de recursos para atender as reivindicações salariais, buscou uma solução fácil e, por meio de um decreto, liberou os técnicos do regime de dedicação exclusiva.

Como o município não poderia oferecer melhores salários eles poderiam manter seus cargos no serviço público e, simultaneamente, buscar a complementação de sua renda prestando serviços à iniciativa privada.

Esta medida determinou o início do processo de corrompimento do serviço público municipal. A partir daquele momento os funcionários da SUSP e do IPUF poderiam exercer ao mesmo tempo o papel de juiz e advogado, opção vedada aos verdadeiros juízes por meio de dispositivo constitucional.

"Art. 95. (...)

Parágrafo único. Aos juízes é vedado:

I - exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério;

(...)

V - exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.

A operação Moeda Verde veio trazer à público algumas das conseqüências deste equívoco administrativo e ético.

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